PROFUSÕES
(Olga
Caixeta)
Todas
as fraquezas e todas as misérias humanas vieram à tona e cobriram a tela da TV
por um longo tempo e todos nós pudemos assistir, comparar, assumir em nossas
vidas muitas passagens que, certamente, fizeram parte do cotidiano imprevisível
que assombra os nossos melhores momentos.
Notamos
durante muito tempo o quanto nos parecem longos os passos incertos que tiram
nossos pés do chão, derrubam o nosso espírito e consomem nossos corações.
É
até engraçado pensarmos que somos todos personagens de infinitas passagens, sem
nos darmos conta do que estamos vivendo e, infinitas são também as vezes que
fazemos comentários sobre o que assistimos sem percebermos a cumplicidade entre
as situações.
Tudo
é tão igual e algumas vezes o que é real supera o que se apresenta na tela.
Estou
aqui falando da novela das nove “Amor à Vida” e dos seus últimos capítulos.
Depois
de centenas de atropelos, traições, mortes, roubos, brigas, separações
aconteceu o inesperado: o amor representando a única possibilidade de o ser
humano ser feliz, sentir-se bem consigo mesmo e justificar a sua relação com os
outros.
O
que corre na net é o beijo dos homossexuais e pude ler comentários dizendo que
“ até que enfim a televisão mostrou estar quebrando tabus e etc...”
Não
quero me ater ao fato, mas àquilo que foi o fechamento: a cumplicidade entre
pai e filho e o desvendamento do sentimento escondido e maltratado no coração
dos personagens, César e Félix.
Se
prestarmos atenção, no decorrer dos capítulos havia uma luta interior no
personagem Félix, o filho, pelo fato de não ser reconhecido, não ser amado.
Tal
fato fez dele uma criatura sórdida, má, inconsequente e, só depois de ter
passado por situações mais difíceis também para ele, a questão econômica, e
encontrado uma mão estendida, não para oferecer dinheiro, mas carinho, atenção,
amor e que exigiu dele uma determinação de atitude refletida, foi capaz de
mudar.
Mudou
e mudou tanto que foi capaz de reconhecer suas fraquezas e entregar-se de vez à
mostra de seus sentimentos.
O
fato pode parecer bobo para muitos, mas para mim foi surpreendente. Exalou um
certo ar de sublimidade que intimidou todas as outras passagens de desafetos e
asperezas.
Li
uma mensagem do Papa Francisco para o XXII Dia Mundial do Enfermo 2014 na qual
ele diz: “ Quando nos aproximamos com ternura daqueles que precisam de cura,
levamos a esperança e o sorriso de Deus às contradições do mundo”.
Ele
fala aqui da enfermidade do corpo e eu falei antes da enfermidade da alma.
Todos nós sabemos que nenhuma das duas situações é melhor ou pior, mas é certo
que tanto uma quanto a outra são dizimadoras do ser humano.
O
final da novela foi providencial para falar de um assunto sobre que muita gente
foge: coisas do coração que descontrolam sobremaneira nossos pensamentos e
nossa força de ação.
De
forma geral, quando o assunto é o próprio EU intimidamo-nos, pois o maior
costume de todos nós é expor o Outro e escondermo-nos atrás de nós mesmos.
Achamos
todas as lições de amor bonitas, mas não expomos a nossa ou nem nos damos conta
de que poderíamos viver uma. A sensibilização acontece-nos e passa como um
vento lá fora.
Sofremos
por causas infinitas e guardamos a sete chaves toda a ira que corrói a nossa
vida, pois acostumamo-nos ao espírito de vingança que nos traz a sensação de
donos do poder.
Apesar
de todos os escrachos que “Amor à Vida” deixou rolar por um bom tempo, o seu
final garantiu-nos um tanto de emoção, algumas lágrimas e muitos comentários.
Não importa que tenha sido sobre o beijo homossexual, já que ele é amor.
Se
amar é em si mesmo um estado de leveza espiritual só ele, o amor, será capaz de
lavar todas as manchas que encobrem o favorecimento de uma boa ação.
Falar
de amor no facebook não é a mesma coisa que segurar as mãos de alguém, não é a
mesma coisa que desvendar no nosso coração a força da vida.
Vivemos
uma época difícil, sem muitas explicações ou respostas, uma época de
relatividade sem mesmo entendermos bem seu significado, mas suponho que
qualquer ser humano responderia para si mesmo sobre seus sentimentos.
O
que eu realmente sinto quando sinto algo infinitamente forte brotar em mim e eu
sei que posso responder com certeza: É Amor?
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*Olga Caixeta é professora de Português,
poeta e membro da Academia Machadense de Letras
Foto fonte: http://veja.abril.com.br/blog/quanto-drama/tag/felix/page/3/